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Varejo e indústria não repassam corte do IPI
Esforço do governo pode ter servido apenas para ampliar o lucro da indústria ou do comércio ou para promover a venda de bens mais caros
PEDRO SOARES
Com o objetivo de dinamizar a economia e estimular o consumo, o governo já abriu mão de R$ 1,6 bilhão via desonerações e reduções de tributos sobre veículos, eletrodomésticos da linha branca e material de construção, mas o problema é que tal benefício não foi repassado, em muitos casos, integralmente ao consumidor.
Segundo levantamento da FGV feito a pedido da Folha, boa parte dos produtos alvo da isenção ou do corte do IPI não sofreu queda de preço no varejo proporcional ao benefício, que deve ser prorrogado. O anúncio está previsto para ocorrer hoje.
Ou seja, o esforço do governo pode ter se convertido em aumento de margens de lucro na indústria ou no comércio -pelos dados da pesquisa, não é possível identificar com precisão qual elo da cadeia deixou de repassar o corte do imposto.
O caso mais emblemático é o dos fogões, cuja alíquota do IPI caiu de 5% para zero. No varejo, o produto baixou, em média, só 0,97% entre abril e junho.
É verdade que não é esperado o repasse total da queda do imposto ao varejo, mas tal nível de redução é desproporcional, segundo Salomão Quadros, economista da FGV.
Em outras palavras, o estímulo do governo serviu para promover mais as vendas de bens mais caros, como geladeiras e lavadoras de roupas -cujos preços no varejo recuaram 3,04% e 4,62%, respectivamente. No caso das geladeiras, o IPI caiu de 15% para 5%. No das lavadoras, de 20% para 10% -o que indica que o repasse também não foi integral.
O comércio, de fato, não absorve totalmente a redução dos impostos na indústria. Isso porque sobre os produtos vendidos incidem outros custos indiretos dos varejistas, como salários, encargos, energia elétrica e aluguel. Para essas despesas não houve redução.
Quadros diz que o preço final é composto por 70% do custo do produto e 30% de demais despesas dos varejistas, mas esses percentuais variam conforme o ramo de atividade, o porte da empresa, a região, o relacionamento com fornecedores.
O IPI é cobrado sobre o preço dos produtos quando eles saem da indústria. Varia geralmente entre 5% e 20%, mas foi zerado em muitos casos.
Se em boa parte dos casos o consumidor final deixou de se beneficiar de toda a desoneração ou diminuição do IPI na indústria, o mesmo não ocorreu com os veículos. Pelos dados da FGV, a queda de preço dos carros acompanhou o corte do IPI.
Os carros com motor 1.0 tiveram o IPI reduzido de 7% para zero. Segundo a FGV, o preço do automóvel novo caiu 6,93% de janeiro a junho.
Dinheiro direto
Na semana passada, o presidente Lula disse que é mais eficaz substituir a política de desoneração de tributos sobre produtos industriais, praticada pelo próprio governo, pela transferência direta de dinheiro aos pobres como forma de estímulo à economia.
A Eletros (associação de fabricantes do setor eletroeletrônico) afirma ter assumido com o governo o compromisso de transferir integralmente o benefício ao preço do produto vendido diretamente ao varejo ou aos atacadistas, mas pondera que "os preços de venda aos varejistas variam de negociação para negociação".
Entre os varejistas, o Magazine Luiza diz que repassou integralmente para os preços a redução do IPI. Maria Luiza Trajano, que comanda a rede varejista, pediu a prorrogação do benefício e foi atendida.
Não foi apenas na linha branca que a redução do IPI não chegou totalmente ao consumidor. No caso de material de construção, a maior parte dos itens analisados pela FGV teve queda de preço inferior ao corte do imposto.
Enquanto o IPI das tintas teve redução de 5% para zero, o preço da do tipo a óleo caiu apenas 1,92% nas lojas. No caso das placas para revestimento (azulejos e similares), o imposto baixou cinco pontos percentuais, mas a queda de preço foi de apenas 0,23%. Para as louças sanitárias, o IPI caiu de 5% para zero, mas o custo desses produtos recuou 2,43%, em média.
Principal produto do setor, o cimento, porém, caiu até mais no varejo do que a redução do IPI -que era de 4% e foi reduzido a zero. Seu custo médio baixou 4,53%.
Segundo Quadros, a cadeia da construção tem mais elos, o que posterga e dificulta o repasse integral da queda de imposto ao consumidor final. Ele acredita, porém, que as reduções ainda possam ser mais intensas, já que o ramo foi o último a ser desonerado pelo governo.
A Abramat (Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção), indagada pela reportagem da Folha, não respondeu até a conclusão desta edição.